POESIA GOIANA
Coordenação: SALOMÃO SOUSA
ITANEI F. CAMPOS
(Uruaçu, Goiás, Brasil)
Graduou-se em Direito pela Universidade Católica de Goiás.
Foi professor de Direito Civil na PUC-GO e na Universidade Anhanguera. É Desembargador do Tribunal de Justica do Estado de Goiás. Membro da Academia Goiana de Direito, da Associação de Magistrados do Estado de Goiás, da ABRAME, do IHGG, e da UBE-GO.
BRITO, Elizabeth Caldeira, org. Sublimes linguagens. Goiânia, GO: Kelps, 2015. 244 p. 21,5x32 cm. Capa e sobrecapa. Projeto gráfico e capa: Victor Marques. ISBN 978-85-400-1248-6 BRITO, Elizabeth Caldeira, org. Sublimes linguagens. Goiânia, GO: Kelps, 2015. 244 p. 21,5x32 cm. Capa e sobrecapa. Projeto gráfico e capa: Victor Marques. ISBN 978-85-400-1248-6
Ex. bibl. Antonio Miranda
BARULHO
(Que barulho é esse na escada?)
(Dummond)
Que formidável barulho
é esse que nos ensurdece?
— É minha vó no oratório
murmurando sua prece,
é fumaça de cigarro
que no ar desaparece.
É língua escavando boca
por um beijo de que carece.
É o não saber se a sombra
é de uma cobra ou dum S.
É o meu pai se escanhoando
no banheiro, ou os silêncios
acumulados na messe.
É o anoitecer que foge,
e o amanhecer que cresce,
ou quem sabe, é a poesia,
a poesia, meu Deus, que fenece...
AFLUÊNCIA
Cassetetes chovendo
sobre a cabeça,
índio queimado
vivo,
crianças comendo cola
e lacraia.
Lobito, Kuito, Goiânia:
nosso povo vagando desterrado.
Desagua o rio Congo no Araguaia?
O VIAJANTE E A POESIA
Sinto que, às vezes, sutil, me espreita
a Poesia, sob a dor permanente que nos vigia,
ou pode vir mesclada em humana e estreita
fala, que se entreabre numa festa de alegria.
A poesia transpira por fontes várias
da própria vida, em sua rota imponderável,
onde nenhum navegador controla o leme
e qualquer tripulante é desejável.
Aquele que navega em rumo inverso
porque sua sina é laborar de forma ingente,
pode estar ele sim singrando certo
que mais que a rota, navegar é que é urgente.
Todos têm suas dores a relatar,
não importa o remoto porto em que se ancora.
Os esquecidos à margem, nos barrancos,
que não velejam, pois não lhes foi dado um lugar,
Podem também chegar ao cais dessa aventura
porque também se amadurece em não buscar.
Estar inerte é também seguir no mundo,
sem esforço ou debates, frente ao verso prisioneiro,
pois o mistério se liberta no silêncio
em que em terra se acrisola o marinheiro.
E se às vezes me abandona a poesia
quando congelo o poço secreto da ternura,
verte sangue o verso esquivo e incompleto
e nesse deserto brota a água mais pura.
MANHÃ
Exibe a manhã a sua
carne úmida e fria.
Beija-a a ventania
volúvel pela rua.
Absorto em fantasia
sigo feito um duende
pela rua de Resende
que antes não conhecia.
—À encosta desses montes
os antigos horizontes —
e viajo em sua voz
de nuvens entretecidas...
Enquanto isso uma neblina
de tristeza cristalina
desce lenta sobre nós...
Sobre nós e nossas vidas...
SONETINHO
Hei de amar-te tão calma e docemente
como poucos amaram nesta vida
que tu te quedarás surpreendida
cativa deste amor, completamente,
dançarás, feito uma estrela nascente,
ao sentir que a carícia que se escondia
apenas te esperava, ao fim do dia,
como se guardava o sopro mais fremente
que atiçasse esse amor feito magia.
de segredos e de risos, fantasia
que vivemos talvez antigamente
quando eu não era o que sou e todavia
outro não era, e já a tua alegria
de longe iluminava o meu presente.
NARCISO
Na superfície polida
do espelho
o reflexo
genuflexo
de pseudo ser
de olhos puídos.
A boca se esgarça
sem grito.
os olhos baços se olham
sem risos.
Que ser é aquele,
irreconhecido,
que emerge
do fundo do tempo
do espelho,
fragmentado,
fragmentido?
*
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Página publicada em junho de 2021
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